sexta-feira, 20 de agosto de 2010

É possível ler na escola? Delia Lerner


Devo ser um leitor muito ingênuo, porque nunca pensei que os escritores
quisessem dizer mais do que dizem. Quando Franz Kafka conta que Gregório
Samsa apareceu certa manhã convertido em um gigantesco inseto, não me
parece que isto seja uma simbologia, e a única coisa que sempre me intrigou
é a que espécie animal pertencia ele. Creio que houve realmente um tempo
em que os tapetes voavam e que havia gênios prisioneiros dentro de
lâmpadas. Creio – como diz a Bíblia – que o burro de Ballan falou, e a única
coisa a se lamentar é não terem gravado sua voz, e creio que Josué derrubou
as muralhas de Jericó com o poder de suas trombetas, e a única coisa
lamentável é que ninguém tenha transcrito a música com poder de demolir.
Creio, enfim, que Vidriera – de Cervantes – era na realidade de vidro, como
dizia ele em sua loucura. E creio realmente na jubilosa verdade de que
Gargântua urinava torrencialmente sobre as catedrais de Paris.
Gabriel García Márquez2

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Aprendendo com os sábios


" Feliz daquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina"

Cora Coralina